RETRATOS; João Lança,
Quero uma Oportunidade
João
Lança filho de Linda de Suza explica a Revista Repórter, o estado de saúde da
mãe, que aos 74 anos, se encontra numa casa de repouso nos arredores de Paris,
o vício do tabaco, a vida caseira a reforma, as memórias e apenas uma única certeza.
A de que a cantora não pretende voltar a Portugal.
- Nas últimas semanas muitas notícias,
algumas contraditórias, têm sido veiculadas sobre o estado de saúde de Linda de
Suza, que em setembro foi internada de urgência. Qual é a situação da sua mãe
neste momento?
- A
minha mãe encontra-se, atualmente, numa casa de repouso, nos arredores de
Paris, depois de ter deixado o hospital no dia 27. Está em convalescença ainda
não sabemos bem durante quanto tempo, mas eu acredito que deva ser por uns bons
meses. O que interessa dizer é que está a recuperar e bem acompanhada.
- Mas que problema de saúde é que ela teve
em concreto?
-
Teve de dar entrada de urgência no hospital por causa de uns picos de febre
alta repentinos. Teve tudo a ver com as sequelas que ficaram de quando, em
2020, apanhou covid-19 e uma infeção pulmonar. Tudo isso foi agravado pelo
facto de a minha mãe continuar a fumar dois a três maços de cigarros por dia.
Entretanto também tinha deixado de se alimentar e por isso até foi bom ela ter
sido internada, porque agora já está a ganhar peso.
- O João não a consegue trazer para
Portugal? Ela não fala nisso ou já não pensa mesmo em regressar?
- No
final de setembro falei-lhe no assunto, até porque era mais fácil para mim
vê-la todos os dias, mas ela definitivamente não quer. Diz que já são 50 anos
de França e que é ali que tem a sua casa a sua vida e a sua carreira. É uma
escolha dela e eu não posso julgar.
- Fala em carreia, mas como está neste
momento a carreira da Linda de Suza em França?
- Há
uns quatro anos que está completamente parada temos de ser honestos, mas ainda
há muita gente que a segue e que pergunta por ela. O problema é que a minha mãe
já perdeu muito da voz por causa do tabaco. E depois estão sempre a inventar
polémicas e isso também não ajuda.
- Nem vê a possibilidade de voltar a gravar
discos?
-
Não. Isso vai ser muito complicado, sobretudo por causa da voz. Vontade e ideias
não lhe faltam, mas vai ser mesmo muito difícil.
- Vieram notícias de França a dizer que a
Linda de Suza estava gravemente doente, com distúrbios psicológicos graves e
outras notícias até diziam que ela tinha morrido!
- Eu
como sei toda a verdade essas coisas passaram-me completamente ao lado. Eu nem me
dou ao trabalho de justificar ou responder. Como é que as pessoas inventam
estas coisas?! Devem ter uma vida muito vazia. É pura maldade e crueldade.
- E a sua mãe não se deixa abater com
essas notícias?
-
Não, porque eu não deixo que elas lhe cheguem. Ainda por cima ela não tem
internet, nem redes sociais e por isso nem lê essas coisas.
- Como é a vida de Linda de Suza e Paris
atualmente?
-
Ela vive sozinha, mas sempre rodeada de amigos, quatro em especial, que vão
rodando entre eles para que ela esteja sempre acompanhada. Eu estou sempre em
contacto com esses amigos e falo com ela também, de dois em dois dias! Fazemos
muitas videochamadas e numa das últimas conversas ela até me disse: ”Não percas
o fogo!”
- Há uns anos escreveu-se que a sua mãe
vivia com dificuldades financeiras por causa de uma reforma de 400 euros. Isso
é verdade?
-
Não. A reforma da minha mãe é muito superior a isso. Não é nenhuma fortuna, mas
está mais perto dos 1500 euros, fora os direitos de autor que ela recebe de
três em três meses.
- Mas em 2015 ela dizia que tinha sido
roubada por agentes e produtores durante muitos anos?
-
Diga-me um nome de um artista que nunca tenha sido roubado. Diga-me um, que eu
digo-lhe que é mentira.
- O João ainda se lembra de ter ido para
Paris com a sua mãe, apesar de muito pequeno (4 anos)?
-
Recordo-me do meu primeiro dia de escola, que chorei muito.
- Mas recorda-se de sair de Portugal?
Filho de Linda de Susa
Mala de Cartão
- É
curioso, porque eu tenho algumas imagens iguais àquelas que se veem no filme,
ela com a famosa mala de cartão e comigo ao colo.
- Quando é que se deu conta da verdadeira
história da sua mãe?
-
Acho que foi por volta dos meus 11/12 anos quando começamos a pensar um bocadinho
mais sobre aquilo que está à nossa volta. Antes disso, nunca me apercebi das coisas,
porque também nunca me faltou nada. Ela podia deixar faltar para ela, mas para mim
nunca. E depois recordo-me que a nossa vida melhorou de um dia para o outro por
essa altura.
- E como é que foi para si lidar com essa
mudança repentina e com uma mãe que subitamente era uma estrela em Paris?
-
Foi muito engraçado, porque para todo o lado para onde ia, eu era sempre a
mascote. E adorava aquilo. Acompanhava sempre os músicos e os técnicos durante
as férias, no verão, e a partir dos 14 anos os concertos todos. Claro que
passar a adolescência em viagens, em bons hotéis e rodeado de adultos era
espetacular e isso também me fez crescer muito.
- E quando é que começou a perceber que
também a música podia ser o seu caminho?
-
Foi justamente nessa altura. Quando se fazia o check sound, eu ia para os
instrumentos e começava a tocar neles. Acho que se apurou ali o meu gosto pela
música. Logo aos 14 anos, a minha mãe oferece-me um piano e esse piano ainda é
o mesmo com o qual faço as minhas composições.
- Mas gostava da música da sua mãe?
- De
algumas sim, sobretudo porque eram bem-feitas e tinham bons arranjos. Mesmo uma
música como ´Tiroliro´, que tinha só dois acordes, foi feita com uma orquestra
de 60 músicos e feita pelo orquestrador Jean-Claude Petit que é um dos maiores
do mundo.
- Mas a determinada altura decidiu voltar
para Portugal? Porquê?
-
Voltei com os meus 28 anos, em 1996, logo eu que dizia que Portugal “nunca”. É
uma história engraçada. Em minha casa só se falava em francês, mas quando eu
conheci por lá a minha mulher (portuguesa) entrei de repente numa família
tradicional onde se falava português. Comecei então a aprender a minha língua.
Depois veio uma altura em que eu quis conhecer o sítio onde nasci, na Amadora, na
Falagueira. E foi aí que comecei a sentir o apelo das minhas raízes. Um dia
virei-me para a minha mulher e disse-lhe: “Eu acho que é altura de ir viver para
Portugal”, algo que a deixou muito admirada. Como tínhamos dois filhos, com 8 e
4 anos, ela disse-me logo: “Se formos não voltamos”. E foi a melhor coisa que
fiz na minha vida.
- Mas veio para Portugal para fugir de
alguma forma do peso do nome da sua mãe?
- Se
calhar, inconscientemente, sim. Uma coisa é certa, quando cheguei foi com a
ideia de fazer o meu próprio trabalho sem usar o nome dela. Se calhar, se o tivesse
feito, hoje era mais conhecido.
- Mas está agora a lançar um novo disco,
´A Cor da Minha Alma´ quando já não o fazia há 20 anos. Porquê?
- Porque
quando fiz o último disco, o ´Não paro de Sonhar´, muitos dos contactos que fiz
diziam-me que, sem bailarinas com as pernas de fora, nunca ia conseguir nada.
Diziam-me também que a minha música não era nem carne nem peixe. E eu, como
nunca quis abdicar daquilo que sou nem da minha identidade, como nunca quis
´prostituir-me´ preferi fazer uma pausa, para conseguir manter sempre o meu caminho.
- O que andou a fazer então?
-
Decidi ir para outros desafios e abrir um restaurante na zona do Areeiro, com a
minha mulher. Estive com esse negócio durante dez anos, mas sem nunca deixar de
fazer música. Um dia surgiu uma oportunidade irrecusável e acabei por vendê-lo.
Foi com esse dinheiro que consegui fazer este novo disco.
- Mas nunca esmoreceu em relação à música?
- Eu
acho que há público para tudo e só quero que me deem uma oportunidade, até
porque ser filho de quem sou fechou-me mais portas do que abriu. Mas eu nunca
paro de sonhar e acreditar sempre nos meus sonhos. Mesmo este disco, que me
levou quatro meses a fazer, foi uma luta para encontrar uma equipa que quisesse
pegar nele.
- E que relação ainda tem com Paris?
-
Lisboa está-me no sangue, mas Paris é emoção, é a minha cultura primeira,
afinal estive 28 anos em Paris. Eu estou mesmo estou mesmo entre as duas
culturas.
Texto inédito pelo colabortador;
Orlando Fernandes, Jornalista
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