Violência doméstica é um dos flagelos que afecta o
mundo inteiro, relata a jovem Sueliny Nunes, desde Cabo-Verde
Relatos da jovem Sueliny Nunes, desde Cabo Verde, ela
que sonha, um dia ser escritora.
“Em Cabo-Verde, nos últimos anos houve vários casos de
violência com espancamento, violência verbal e outros casos, em que até leva ao
feminicídio, de forma expressiva.
Toda a mulher deseja um homem que lhe dê amor, carinho
e protecção, não um homem que a espanca, que lhe bate e deixa marcas no corpo.
Muita vezes, os filhos são os mais prejudicados,
porque quando o pai é agressor e a mãe vítima chega um dia que, depois de tanto
espancamento, o agressor resolve tirar a vida da vítima; com a mãe falecida e o
pai preso a criança muitas vezes fica nas instituições, se não tiver parentes.
Muitas vezes, a criança fica traumatizada e, mesmo que receba amor e carinho no
novo lar, nunca será igual ao amor da mãe.
A sociedade culpa as vítimas, dizendo que elas gostam
de apanhar do parceiro, mas na minha opinião é medo, vergonha e muitas vezes
por depender financeiramente do parceiro. Se uma relação não está dando certo
não precisa ter espancamento nem morte; nada que uma conversa não resolva.
Os homens têm que respeitar as suas mulheres,
principalmente por serem mães do(s) filho (os). Quando acontece uma violência,
que muitas vezes leva à morte são vidas destruídas, sonhos interrompidas;
muitas vezes as crianças, de tanto presenciar o seu pai bater na sua mãe, criam
um instinto agressivo e, quando tiverem uma briga com a sua futura mulher, acham
que a melhor forma de impor respeito é partir para a agressão.
Em toda a parte do mundo existe um número elevado de
adolescentes e mães espancados e outros até assassinados pelos parceiros, muitas
vezes por causa de ciúmes doentios, em que a melhor forma de evitar a violência
é fazer denúncia à primeira ameaça; as mulheres têm que ser fortes e nunca
admitir que nenhum homem levante as mãos para lhes bater, porque mulher foi
feita para ser amada, protegida e respeitada, não espancada, nem assassinada.
Nunca permitam que um homem vos bata, para depois dar
uma flor, porque flor não apaga as marcas na cara, nem as dores causadas.
Denunciar é a melhor forma de salvar uma vid; contudo,
a maioria não o faz, por opressão!”
Este
testemunho chegou-me pela Sueliny Nunes, que dias depois de me entregar este
texto refere que o Padrasto a pôs fora de casa e que está a passar um mau
bocado e que a mãe não pode fazer nada, porque a casa é do Padrasto, pelo que
percebeu muito bem que se a mãe se opusesse iria ficar também sem tecto, juntamente
com os outros filhos. Lá está, é nestes casos que há violência doméstica,
verbal, psicológica e até sexual; não sei se é o caso, porque a Sueliny
Nunes não me contou. As meninas, em Cabo
Verde, são muito inteligentes, sabem defender-se de forma a que ninguém as
enrole, a não ser que queiram partilhar algo; aqui, elas sabem que é para
publicação na Revista Repórter X na Suíça. A Sueliny Nunes gostava de ser escritora, ser útil à sociedade
cabo-verdiana, mas não tem como, não há como superar as dificuldades, há muita
gente nestas condições. Há famílias desestruturadas. Há crise governamental. Há
pobreza intelectual. As pessoas prendem-se às coisas, com medo de superar. Pedi-lhe
para escrever sobre Cabo-Verde, mas diz não ter meios, não tem telefone capaz,
não tem PC e, por isso, não consegue, mesmo a pagar. Aceitava, se pagassem
antes, mas eu nunca o faria e só sendo estúpida o faria. Eu também trabalho e só
depois é que recebo, não andamos com o carro à frente dos Bois. Elas podem
contar histórias verdadeiras e pelo meio meias mentiras, para conseguirem
dinheiro. Se bem que a pobreza faz com que estas criaturas humanas lindas podem
ou tentem fazer algo para conseguirem ter uma vida melhor que aquela que nunca
escolheram, e que deixa muito a penar. Na sequência deste texto, mais tarde
quando confessa estar na rua a viver, logo no segundo dia, ela diz que preferia
vir para a Europa prostituir-se que ficar na miséria em Cabo-Verde. Verdade.
Fiquei boquiaberta pela coragem de dizer o que sentia com a amargura da vida.
Testemunho;
Sueliny Nunes
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