A reforma entre dois países, quarenta anos de trabalho e um valor que envergonha:
A reforma começou a ser paga, mas o seu valor continua muito aquém do que representa uma vida inteira de trabalho. Depois de quatro décadas de descontos repartidos entre Portugal e Suíça — vinte e três anos num país, dezassete no outro —, o resultado é uma pensão que não assegura a sobrevivência digna de quem trabalhou e descontou sem falhas.
As comunicações oficiais confirmam apenas formalidades, ignorando o essencial. O Centro Nacional de Pensões limitou-se a informar que procedeu à actualização de dados bancários e que os “e-mails foram reencaminhados para a equipa responsável”. Não há resposta técnica às questões apresentadas, nem explicação sobre os valores atribuídos, nem sobre o direito ao complemento social e ao acréscimo legal de subsistência.
O caso expõe a falência de um sistema que, ao invés de proteger, complica. Portugal e Suíça partilham um acordo de coordenação internacional das pensões, segundo o qual cada país paga a sua parte proporcional. Na prática, isso significa que o trabalhador recebe duas reformas separadas, calculadas por dois sistemas que pouco comunicam entre si, deixando o cidadão no meio de uma engrenagem que gira sem alma.
Os serviços suíços reconhecem a existência do processo internacional, mas remetem para Portugal as responsabilidades pela parte portuguesa. Portugal, por sua vez, limita-se a cumprir a sua rotina administrativa, sem corrigir valores e sem reconhecer o percurso contributivo completo. Nenhum país assume o dever de garantir uma pensão justa no total.
Ao fim de quarenta anos de contribuições — vinte e três em Portugal, dezassete na Suíça —, o que deveria ser segurança transformou-se em incerteza. Quem trabalhou uma vida inteira entre dois países recebe agora o mínimo possível, sem que nenhum dos dois reconheça plenamente a extensão do seu dever.
O caso não é isolado. Representa o destino de muitos emigrantes que, ao regressarem ou envelhecerem, descobrem que o tempo e o esforço de décadas se diluem nas falhas dos sistemas. A coordenação entre estados, que deveria proteger, tornou-se uma fronteira invisível onde os direitos se perdem.
Enquanto os gabinetes trocam ofícios e relatórios, a pensão chega pequena e fria. O trabalho foi grande, a resposta do Estado é mínima. E a justiça social, que deveria sustentar o fim de vida de quem construiu o seu país e serviu outro, continua adiada.
Autor Quelhas
Revista Repórter X Editora Schweiz Oficial

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