"Quando o sistema adoece o doente"
Uma mãe, um atestado recusado, e o silêncio de quem deveria cuidar
Por Revista Repórter X
Zurique, 2025.
Uma mulher, trabalhadora desde os 16 anos, mãe recente, enfrenta um sistema de saúde que lhe vira as costas no momento em que mais precisa. Após um parto traumático, surgem os primeiros sinais de uma depressão, não reconhecida, não acompanhada, não acolhida.
O nome da paciente não será revelado, por razões de privacidade. Mas a sua história é real. E representa tantas outras que permanecem caladas, entre quatro paredes, a sofrer em silêncio.
Logo após a licença de maternidade, tentou regressar ao trabalho com um horário reduzido, apoiada por um atestado médico. Quando o seu estado se agravou, procurou ajuda especializada. A psiquiatra, recusou continuar o tratamento alegando não ser a especialista adequada, pois se trataria de uma “depressão normal” e não pós-parto. Antes disso, a doente tinha-lhe solicitado um novo atestado, recomendação dada pelo próprio médico de família. Coincidência? Improvável.
Transferida de um profissional para outro, a mulher viu-se sem atestado, sem acompanhamento, e com o peso da dúvida colocado sobre a sua dor. O médico de família recusou continuar a tratá-la, com base numa conversa telefónica com a psiquiatra. Um novo médico recusou também qualquer apoio, afirmando que a conhecia “há pouco tempo” e que os sintomas “já duravam há demasiado”.
Como pode alguém adoecer demasiado tempo para merecer cuidado?
Como pode o sofrimento ter prazo de validade?
Enquanto isso, a paciente procurava soluções: psicoterapia com uma profissional que reconhece a sua incapacidade laboral, mas que legalmente não pode emitir baixa. Acompanhamento recusado em instituições de urgência por falta de vagas. Um sistema que, em vez de amparar, empurra. Que, em vez de ouvir, cala. Que, em vez de tratar, julga.
No centro deste drama humano está uma questão simples e brutal:
Pode um médico negar atestado a quem está doente?
E mais ainda:
Tem o sistema o direito de forçar uma mulher exausta, ferida, frágil, a trabalhar como se nada se passasse?
Há algo de profundamente errado quando o doente precisa justificar-se perante o sistema como se fosse réu. Quando os atestados se tornam favores e não direitos. Quando a saúde mental é tratada como um incómodo administrativo.
Esta mulher não pediu privilégios. Pediu tempo. Pediu escuta. Pediu o mais básico dos cuidados.
Recebeu recusas.
Agora muda-se de casa, com o corpo em tensão, a alma sem chão, e sem médico que a acompanhe.
Vivemos tempos onde o ser humano é avaliado pela produtividade. Onde a doença, se não tiver feridas visíveis, é considerada capricho. E onde o medo de “abusos” justifica a negligência.
Quantas mais terão de passar pelo mesmo? Quantas mães, filhas, trabalhadoras, serão forçadas a escolher entre a saúde e o emprego, entre o silêncio e a humilhação?
Na Suíça, país tido como modelo de eficiência, a máquina parece funcionar tão bem que esqueceu que trata de pessoas. Mas quando a engrenagem começa a triturar aqueles que devia proteger, não é a paciente que está doente.
É o sistema.
E quando o sistema adoece o doente, não basta tratá-lo com medicamentos. É preciso coragem. É preciso verdade. É preciso gritar onde outros calam.
A Revista Repórter X estará aqui para dar voz a essas verdades.
Uma por uma.